Como entender a fenomenologia e
qual sua relação com a intencionalidade em Husserl e Sartre? É na busca dessa
resposta que iniciamos a nossa dissertação tendo em vista que ambos os
filósofos têm perspectivas diferentes, porém correlacionadas entre si.
Significar a fenomenologia em
Husserl é entender os modos de aparecer e ao mesmo tempo do manifestar-se da
essência das coisas à consciência. A essência não é adquirida por meio da
abstração empírica como sustentam os empiristas, mas sim por meio da intuição da
essência, que Husserl chamará de intuição eidética.
Essa intuição é determinada pela maneira de aparecer (ou aparição) dos
fenômenos à consciência.
Husserl fundamenta o seu
pensamento a partir do conceito de consciência como algo que é caracterizado,
necessariamente, por uma intencionalidade. A consciência para o fenomenólogo é
um fluxo intencional que se dirige ao objeto intencionado e existente. Não se
pode ter consciência do nada, como se o nada pudesse ser visado. Nesse sentido
toda consciência é intencional, isto é, toda consciência é consciência de
alguma coisa, ter consciência é noese,
e noema é o objeto do qual se tem
consciência. A consciência não pode ser reduzida às pretensões empíricas, uma
vez que nela, não se toca, nem se pode tomá-la para si (à mão) como se fosse um
objeto concreto. A intencionalidade como o elemento essencial da consciência é um
visar a ser, um estar aberto a ser... É transitoriedade entre sujeito e objeto
intencionado.
Talvez, o ponto chave da
fenomenologia em Husserl é que, toda intencionalidade visa o fenômeno, que é a
aparição das coisas e não, aparência. Para Husserl há diferença entre aparição
e aparência. Entendemos a primeira como algo que remete à essência da coisa em
si. Já a última, numa linguagem kantiana, podemos entendê-la como uma ilusão,
algo que está fechado, o oposto de consciência, por fim, é o que se manifesta. Porém,
para Husserl a aparência não deve ser entendida como contraposta à coisa em si.
Pois, toda intuição que apresenta alguma coisa deverá ser fonte de conhecimento
e, todo objeto que se apresenta a nós como intuição deverá ser compreendido da
forma como se apresenta.
Para a fenomenologia há diferença
entre “conhecer o aparecer do objeto” e “conhecer o objeto que aparece”. Se
conhecermos o que aparece do objeto é bem provável que viveremos o aparecer do
objeto que aparece. Esse conhecimento do aparecer diz respeito a um
conhecimento pautado em crença, senso comum, ou persuasão.
Husserl pensava criar uma
filosofia fenomenológica rigorosa que suspendesse tudo aquilo referente às
doutrinas filosóficas nas discussões metafísicas, e posteriormente, suspender,
sobretudo, as crenças, as verdades das ciências e aquilo que afirmamos na vida
cotidiana. É nisso que resulta a epoché,
que significa suspensão de juízos sobre tudo o que nos diz as doutrinas
filosóficas e as nossas convicções. O objetivo da epoché é de atingir uma evidência e algo objetivo. Para o
fenomenólogo em questão, nada resiste à suspensão, exceto a consciência,
portanto, esta é algo evidente, é aquilo que constitui o mundo e a essência da
existência das coisas.
Além de Husserl, também Heidegger
e Sartre beneficiaram-se da fenomenologia, embora de formas muito diferentes
entre si. Os dois últimos fundaram uma nova forma de pensar o fenômeno se é que
podemos considerá-los de fenomenólogos. O certo é que as diferenças conceituais
entre o trio parecem ser algo inovador. Pois, enquanto Husserl pensava na
consciência como algo que intencionava um fenômeno, ou como pura
transitoriedade entre o sujeito e o objeto, Heidegger a via como pura ilusão
metafísica. Para este, o que existe é o Dasein
e não a consciência. O termo alemão tem conotação existencial do ser e,
significa, literalmente, o “aí do ser”.
O certo é que no Dasein já não há intencionalidade como
vimos em Husserl, mas sim, uma preocupação enquanto conceito chave que remete á
afetividade do ser. O ser para Heidegger é um existente preocupado que,
enquanto possibilidade, foge de toda categoria da linguagem. Ele está aquém da
capacidade ôntica e empírica (afeto, desejo, conhecimento, linguagem). Ele se
dá em três momentos: ser no mundo, ser com os outros e ser para a morte.
O primeiro conceito remete ao
sentido de existência, ele é puramente existir, e por isso, é projeto que
transforma as coisas no mundo. O segundo conceito é aquele que não é capaz de
existir temporalmente sem outros e sem os cuidados com os outros. Aqui parece
claro o ser que se preocupa com a existência do outro e com a possibilidade da
liberdade de assumir sua própria liberdade. O terceiro e último conceito é o
ser para a morte, aqui há a realização do ser. A morte não é, senão, impossibilidade
permanente da existência, ela é a possibilidade de que todas as demais
possibilidades se tornam impossíveis. Dessa forma, a morte é o nada, é o
sentido autêntico da existência.
É nesse sentido, do ser para a
morte, que é possível apreender o ser como aquele da angústia diante da morte.
A angústia é uma experiência reveladora do nada que põe o ser diante existência
anônima. Por essa razão, o Dasein
revela o nada da existência.
Sartre por sua vez, parece mais
próximo de Husserl do que Heidegger, uma vez que ambos compartilham de forma
semelhante a respeito do conceito de consciência. Para Sartre a consciência é
consciência de qualquer coisa, ela é um nada que intenciona o ser. Esta se
presentifica apenas no humano, este é indeterminado ontologicamente, além
disso, é pura existência, e, por assim ser, é o nada. Esta categoria, nada, é
livre e indeterminada, é ela que condena o homem a viver totalmente livre. Para
o fenomenólogo o ser humano está condenado à liberdade, esta por sua vez, é
pura possibilidade.
Apesar de Sartre dividir o
conceito de Ser e de humano, ele afirma que o homem é consciência do ser. O ser
é entendido como o Em si, as características destes são: isento de consciência,
de possibilidade, de existência e de liberdade. Já o humano se caracteriza como
o oposto do ser, suas principais características se dão pelo fato de possuir
consciência aberta à qualquer coisa, possibilidade, liberdade, existência, e
por ser indeterminado. O de ser indeterminado é condição para a existência de
todas as demais características.
REFERÊNCIAS CONSULTADAS
REALE, Giovanni; ANTISERI,
Dario. História da filosofia: de
Nietzsche à escola de Frankfurt. Vol. VI. São Paulo: Paulus, 2006.
A construção deste
trabalho baseia-se no texto de Jean-Paul Sartre, intitulado: “Uma ideia fundamental da fenomenologia de
Husserl: a intencionalidade”.
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